quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Diário de Bordo: Vieques - Culebra - Culebrita (Parte 2)

Dia 6 - 24/Nov - Ensenada Honda, Vieques (PR)

O sol deu as caras hoje e junto dele o ventilador ligou também... a frente fria já dissipou e o vento alísio retomou o seu lugar com força. O leste entrou firme bagunçando tudo a volta não nos convidando à nos lançarmos ao mar, pois é justamente contra ele que temos que seguir. O ideal seria ficarmos quietos aqui por uns 2 a 3 dias esperando o vento acalmar, mas infelizmente não vai dar.

Estamos há 2 dias sem previsão do tempo pois aqui não chega sinal de celular. Em uma situação normal não seria problema pois baixamos o forecast de 7 dias antes de sair, mas o que nos gera a dúvida e ansiedade é que na última vez que vimos a previsão, mais um furacão tinha acabado de ganhar força no Caribe. Este agora armou no sul próximo a costa do Panamá/Nicaragua... e dias atras o rumo dele era uma incógnita. Saber para que lado o bicho vai virou uma das nossas principais preocupações.... 

Depois de um rápido debate a bordo decidimos seguir viagem. Ficar aqui isolado do mundo sem ter notícias do tempo pode vir a se tornar um problema ainda maior. Vai que o desavisado resolve subir a nordeste passando perto de Porto Rico assim como o último...

Levantamos âncora, subimos as velas e pau na máquina! Pegamos por duas horas o maior mar que vimos até aqui. Como a costa sul de Vieques é bem rasa (<15m) o leste empurrou um mundo de água com vontade fazendo o mar subir com ondas de até 3m desencontradas. De novo o ITACARÉ pulou feito cabrito fazendo ranger a fibra e mais uma vez nossa jovem tripulação foi testada.

Seguimos firme contra mar, vento e corrente andando a 4 nós por quase duas horas. A bordo o povo seguia calmo contemplando o burrifo das ondas explodindo no casco e não se intimidando com o mundo de água que as vezes atropelava a frente do Itacaré. "Papai, você acha que essa aqui tem mais de 3 metros?!", eles se divertiam medindo e procurando as maiores ondas. Bacana ver que alto mar deixou de ser novidade, mesmo em uma situação mais desconfortável. Como tudo na vida... a gente também se adapta e acostuma com o alto mar.

Horas depois o sacrifício virou prazer, pois quando chegamos na ponta leste da ilha viramos nosso rumo para o norte. E o vento e corrente que há pouco nos atrapalhavam, viraram nossos aliados nos empurrando rumo a Culebra. O ITACARÉ voou de asas abertas com ventão de través chegando a bater 10 nós mesmo com velas rizadas (reduzidas). Um espetáculo!

Nestas 4 horas tivemos vários ataques na nossa linha. O primeiro foi logo na saída e a linha chegou a arriar a varinha de tanta pressão... e depois de muita luta trouxemos metade de uma barracuda a bordo. A outra metade acho que ficou na barriga da mamãe tubarão.... e a pressão na vara foi justamente o cabo de guerra para ver com quem ia ficar o peixe.

Depois puxamos um xaréu de bom tamanho e na mesma linha veio junta outra barracuda. Mas o maior e mais pesado ataque veio quase no final. A carretilha disparou acelerada aos berros sem parar. Deixei correr.... e depois lutei firme com todas as forças quase sem conseguir enrolar a carretilha tamanha a pressão. Pouco depois a linha afrouxou.... recolhemos, mas desta vez a isca voltou inteira, foi ponto pra eles. Uma pena. Esse era dos grandes. Nem preciso dizer que cada ataque e ziiim da carretilha a tripulação mirim vai loucura aos gritos de "suchi, suchi, suchi!!"

Chegamos em Culebra começo da tarde e ancoramos a 4m de profundidade no fundo da Ensenada Honda junto de várias outros veleiros. Mal chegamos e já fomos pro dinghy Dock de bote procurar o happyhour local e fazer um reconhecimento na vila que fica em frente. Já na chegada fizemos amizade com uma família da Alemanha e outra dos EUA. Depois de dias sem ver civilização - e apos um mar como esse, uma cerveja gelada sentado em um boteco vale ouro!

Ancoragem na Ensenada Honda, Culebra


Dia 7 - 25/Nov - Ensenada Honda, Culebra (PR)

Hoje nosso dia foi em terra, sem relatos náuticos. Acordamos cedo e engatamos na homeschooling e logo depois montamos nossas bikes dobráveis, fomos de bote pro pier em frente e pedalamos praticamente o dia todo a ilha de Culebra. Depois de dias no mar, aproveitar a terra firme tem o seu valor.  E rodar a ilha de bike com os moleques na garupa foi um barato.

Devemos ficar aqui mais uns dias antes de novamente nos lançarmos para as ancoragens ao redor.


Dia 11 - 29/Nov - Culebrita (PR)

Levantamos âncora e seguimos viagem para Culebrita, uma pequena ilha que fica em frente à Culebra, 20 minutos de onde estávamos.

Impressiona a quantidade de peixes grandes que tem por aqui.. falei sobre isso dias atras quando experimentamos a pescaria de linha, mas agora foi a vez de ver tudo de perto a olho nu mesmo.  Na ancoragem em Culebrita dois grandes anemuras (?!) ficaram por horas nadando debaixo do barco - acho que são aqueles peixes-piloto que agarram nos tubarões. Eles são esquisitos, de cabeça chata... e parecem que foram feitos ao contrário de cabeça para baixo. Nadam rápido, nervosos... e acho que tem mais de 1m cada um. Não sabia que esses bichos podiam ficar tão grandes.

Grande também é a quantidade de barracudas que tem por aqui... como o povo não gosta delas por causa da cigaterra... elas reinam e aparecem em cada ancoragem para fiscalizar o que tem por perto. E a bicha é danada e territorial. Hoje quando estava pegando lagostas uma das grandes deu de cara comigo e ficou me cercando pra onde eu ia. Quando recuei para o bote a danada veio atras me farejando como um cão de caça. Eu estava sem o arpão e cheguei a ficar preocupado... mas depois voltei armado para ver o que a bicha ia fazer... vez ou outra eu nadava na direção dela e ela recuava um pouco para minutos depois vir na minha direção me encarando cheia de dente. Como não da pra comê-la deixei quieto e retornei pro barco pois já estava entardecendo...  (e tava desagradável ficar de costas afundado entre recifes com uma bichana destas me cercando).

Pegamos também nossas primeiras lagostas da viagem. Uma fizemos na churrasqueira, as outras duas (menores) fizemos como entrada cozinhando na panela com água e depois passando no azeite na frigideira. Espetáculo!

Nestes últimos 4 dias experimentamos várias ancoragens ao redor... Culebra e Culebrita são cheio de cantinhos bacanas de água cristalina. Mas a ancoragem mais bonita acho foi a da praia principal em Culebrita - uma pequena praia linda de água turquesa, rodeado por recifes e coqueiros. Valeu muito também fazermos a trilha até o farol no alto morro.


Caminhada até o farol de Culebrita - uma pequena ilha que fica em
frente a ilha de Culebra - lado leste de Puerto Rico




Nossa primeira lagosta da viagem... virou barbecue no nosso fim de tarde

Praia em Culebrita... uma das mais bonitas que vimos até aqui



Dia 12 - 30/Nov - Ensenada Honda, Culebra (PR)

Retornamos há pouco para Ensenada Honda na ilha principal para repor os mantimentos, comprar gasolina para o dinghy e encher nossos galões com água potável - momento em que escrevo estas palavras e aproveito a internet para publicar mais um post.

Hoje pela manhã participamos de um aniversario de 6 anos de um menino americano de um barco vizinho. A festinha foi na praia e outros velejadores também participaram. Nossos filhos se esbaldaram nos doces e nas brincadeiras com as outras crianças. Muito bacana a simplicidade e naturalidade da vida a bordo.

Já estamos de olho na previsão de tempo pois nas próximas semanas devemos seguir viagem para República Dominicana - ou talvez direto para Turks & Caicos - umas ilhas paradisíacas a 450milhas a nordeste daqui, já colada nas Bahamas - local onde passaremos o Natal, Ano novo e o mês de Janeiro.










quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Diário de bordo: Vieques - Culebra - Culebrita (Parte 1)

Dia 1 (19/nov): Palmas Del Mar -> Pta Arenas, Vieques (PR)

As encomendas que esperávamos chegar pelo correio chegaram pela manhã (umas peças que precisamos trocar no mastro e vieram dos EUA). Não perdemos tempo... rapidamente já aprontamos o barco e seguimos viagem para Ilha de Vieques, uma ilha a leste de Porto Rico, uma hora e meia de viagem da marina.

Saímos por volta das 12:00 motorando com mar calmo e vento fraco de nordeste... subi a vela mestra para caso o vento melhorasse e por azar tivemos mais uma quebra. Desta vez foi a catraca elétrica que parou de girar sem aviso prévio, bosta.

Tivemos dois ataques fortes na nossa linha... provando que a técnica de usar o "BIRD" como chamariz junto da isca realmente funciona.

O primeiro foi logo a 15 minutos de viagem... mordeu forte disparando o ziiiiiiiimmmm da carretilha mas segundos depois a linha afrouxou.

O bichano deu sorte pois o anzol não fisgou. O segundo ataque foi mais firme... pra animar a tripulação. A distância já vimos o brilho prateado de um belo atum de uns 4kg brigando pra ser puxado a bordo.

Aprimoramos ainda mais a técnica para limpa-lo e tirar os filés... tô ficando bom nisso. Desta vez deixamos o bicho de cabeça pra baixo sangrando dentro de um balde e o resultado foi ótimo pois a carne ficou mas clara sem manchas escuras.

E usei também uma faca bem fina cumprida que compramos recentemente.. um espetáculo, o corte parece na manteiga. Minha Branca também fez upgrade na arte da culinária e rapidamente preparou arroz japonês e jantamos uns belos temakis (tudo bem que a arte de enrolar o cone ainda tem que ser melhor desvendada).

Ancoramos em Punta Arenas (lado oeste da ilha) com facilidade a 2m de profundidade em um claro fundo de areia. Mergulhei para verificar nossa ancoragem e me animei em ver que nossa Rocna de 25kg (nossa nova âncora) estava completamente enterrada deixando somente a aste pra fora. Valeu o investimento.

Em nossa ancoragem tem um outro veleiro vizinho... e de bate pronto ele veio nos cumprimentar: "De onde vem este ITACARÉ?", o amigo emendou falando em português. Mais uma das coincidências da vida a bordo. 

O veleiro Renewal é de uma família de americanos que viveu a infância no Amazonas e depois nos Açores. Moram a bordo por 3 anos e este ano decidiram mudar de vida e pararam em terra e compraram uma casa em Porto Rico. Papo vem e papo vai... e descobrimos que meses atras eles estavam lado a lado por semanas com nossos amigos do El Caracol em Turks and Caicos. Mundo pequeno.


Tivemos uma noite agradável de muito bate papo no barco deles.. valeu amigos ! Pena que o tempo foi curto e amanhã vamos um pra cada lado. A gente pra leste contornando Vieques e eles de volta pra Porto Rico.

Para finalizar um ótimo dia, vimos hoje uma das noites mais estreladas e limpas até aqui. Ficamos por horas no teto do barco olhando pro céu. Este, sem duvida, é um dos vários prazeres da vida a bordo.


Dia 2 (20/nov): Punta Arenas, Vieques (PR)

O sol deu as caras hoje. A distância víamos as nuvens negras paradas sob Porto Rico e deu pra entender o porque de todo dia chover por lá. A umidade vem do mar e esbarra com os morros altos de Porto Rico acumulando tudo por lá. Mesmo efeito da nossa Serra do Mar entre Ubatuba e Angra.

Rodamos todas as praias da nossa ancoragem com nosso caiaque e nosso standup. Tava sentindo falta de fazer isso. Falamos também por WhatsApp com amigos no Brasil... ficamos sabendo das novidades no trabalho e com saudades do povo todo!

Tomei coragem também e desmontei a catraca elétrica... foi como desmontar e remontar um quebra-cabeca. Aproveitei para limpa-la, lubrifica-la, e com cuidado recoloquei tudo no lugar.. deu certo. Animado apertei o botão para testá-la e....... pronto. Continuou sem funcionar. Bosta. 

Fim de tarde seguimos motorando sem vento contornando Vieques pelo lado sul até uma ancoragem em frente a um pequena vila (Esperanza). No caminho tivemos novamente dois ataques fortes na nossa linha anunciado aos gritos pela carretilha.

Desta vez puxamos duas grandes barracudas pesadas e cheia de dentes. Foram nossos maiores peixes até aqui... talvez uns 8kg a 10kg. Com cuidado devolvemos elas pro mar para sofrimento das crianças. Dizem que por aqui as barracudas comem peixes de recife que se alimentam de uma alga venenosa chamada cigaterra...  e se você der o azar de comer uma delas a coisa pode ficar feia.

Aproveitamos o motor ligado e ligamos nosso watermaker e enchemos nosso tanque. Eu tava preocupado pois ele estava a quase 30 dias sem funcionar. Ainda bem que deu tudo certo... e por enquanto água não é um problema.

Ancoramos em frente à vila em um fundo ruim de grama. Mergulhei para verificar e nos susto vi nossa Rocna travada em um grande cano de ferro 4m de profundidade. Ralei para soltá-la e arrasta-lá no braço para longe do cano. E depois ajustamos a ancoragem com calma. A branca deu ré no ITACARÉ e eu fiquei na água observando a corrente esticar e a âncora forçar passagem no fundo duro e se enterrar por entre a grama. Gostei do que vi... havida no mar, confiança na âncora e sinônimo de noites bem dormidas.

A chuva desabou torrencial começo da noite. Fantástico ouvir ela batendo no casco do barco e a gente enrolado no lençol dentro da cabine. Este é outro dos bons prazeres da vida no mar.


Dia 3 (21/nov): Esperanza, Vieques (PR)

Choveu a noite toda, torrencialmente, horas se parar...  Se nosso barco fosse uma casa na terra certamente ficaria alagado.

Tá tudo molhado a nossa volta e a vida a bordo fica meio bagunçada e desconfortável. Tem uma frente fria estacionada a norte de Puerto Rico e o mal tempo estacionou por aqui.

Fizemos a homeschooling pela manhã tentando tirar um pouco do atraso e engatamos no jogo de war a tarde.

A chuva continuou a tarde toda lá fora e a guerra mundial comeu solto a bordo do ITACARÉ. Muito bacana ver a atenção e empenho dos moleques no jogo... os bichinhos comemoram cada disputa de território como se fosse um gol no futebol.

A chuva não deu trégua hora nenhuma e decidimos ficar mais uma noite por aqui.

Dia 4 (22/Nov): Puerto Ferro, Vieques (PR)

Os dias estão se misturando e se não fosse por este diário de bordo ou pelo calendário já estaria perdido na sequência dos fatos. Estamos a dias sem internet e o sinal de celular é bem fraco, o que ajuda na nossa sensação de isolamento.

De novo choveu a noite toda, aproveitamos o dia feio para levantar âncora e seguir mais a leste da ilha de Vieques. Quando saímos do abrigo da enseada que estávamos sentimos a força do mar vindo de sudeste. De novo motoramos dado mar e vento contra. O ITACARÉ sacudiu e bateu um pouco mais nada grave. 45 minutos depois já ancoramos em Puerto Ferro - uma enseada bastante abrigada por todos os lados, com fundo de lodo de 2M e rodeado por mangue.

Como o sol deu as caras fraco entre nuvens deixamos a homeschooling pra parte da tarde (quando deve chover de novo) e fizemos um reconhecimento a remo de caiaque e standup pelos canais de mangue a nossa volta. Muito bacana.

Pra ser perfeito faltava um fundo de areia para deixar a água clara. Chamou a atenção 4 barcos abandonados no meio do mangue... parecem barcos fantasmas abandonados há anos. Tirando eles.... não tem mais nada a volta. 

A noite a ancoragem ganha ares ainda mais remotos e o breu da noite e o silêncio total chegam a atiçar os fantasmas na nossa cabeça. A Branca fica um pouco apreensiva... e eu durmo igual um neném.


A chuva parece que não vai dar trégua. Se ficar assim já devemos seguir viagem mais a leste amanhã pela manhã.


Dia 5 (23/Nov): Ensenada Honda, Vieques (PR)

Acordamos cedo e já levantamos a âncora rumo a Enseada Honda, 45 minutos contravento a leste. Foi tiro curto... e pouco tempo depois já estávamos seguramente ancorados a 5m de profundidade no fundo da baia. 

Essa baia é também muito bem abrigada, bastante selvagem, porém a água é mais limpa... criando um visual mais simpático, comparado com a última que estávamos. O único sinal de civilização que temos a nossa volta é um outro barco que divide a ancoragem com a gente. Fora ele, o resto é mar, morro, mangue e céu. Estamos completamente isolados. Adoramos esse lugar! 

Aproveitamos o sol da parte da manhã e fomos de dinghy (bote) até os recifes da entrada da baia tentar pegar lagosta. Não demos sorte e não vimos nada que valesse a pena .. e nem um tiro sequer disparei (pra tristeza dos moleques). Mas valeu muito o passeio pois vimos umas 15 arraias de tudo quanto é tamanho e vimos também um tubarão nurse (lixa) calmamente deitado entre as pedras. Chamei os moleques pra ver e eles vieram colados comigo apreensivos. Foi a primeira vez deles vendo um bicho destes de perto. Bacana a experiência que eles estão tendo vendo o mundo ao vivo e a cores. Às vovós que devem estar me lendo eu aviso: fiquem tranquilas pois este tubarão é bobão e não faz nada, ok?!

A tarde engatamos na homeschooling... e próximo ao por do sol saímos de caiaque e standup para explorar os mangues que ficam a nossa volta. Excelente o programa também. Seguimos a remo deslizando suavemente por um braço de rio que hora estreitava, hora abria-se. Levamos a GoPro... e em breve devemos publicar alguns vídeos. 

Mas o mais emocionante ficou para o final: Ze Cuca voltou remando no standup e nós três (eu, Branca e Bruno) voltamos no caiaque logo atrás. Quando ele chegou próximo ao ITACARÉ pulou na água pra subir no barco... nadou um pouco batendo perna para logo subir na escada e tomar banho. Seguimos logo atras (do Caiaque direto pro barco) e minutos depois estávamos todos juntos tomando banho na popa do barco.

Neste momento todo mundo arregalou os olhos ao ver na nossa popa, no mesmo percurso que o Lucca tinha acabado de fazer, um cação nadando na superfície quase esbarrando no barco. Esse não era Nurse/Lixa... mas também não sei dizer de que tipo era. Acho que ele veio curioso com o barulho das pernadas do Lucca... e veio farejando quase esbarrar na escada do ITACARÉ por onde o Lucca havia subido minutos antes. Foi tipo cena de filme com barbatana e tudo pra fora d'Água.

Enquanto o povo tava de olhos arregalados vendo o rebolado do bichano deslizando na superfície a 1 metro de distância... por extinto corri para pegar o arpão. Imaginei um tiro certeiro vindo de cima e pensei logo em uma bela moqueca de cação para o jantar. Mas não deu certo pois quando voltei ele já havia sumido.

O bicho era pequeno... talvez uns 60cm (uns 8kg?!)...mas fiquei com uma dúvida: será que a mãe dele também anda por aqui?

A noite fechou animada com mais uma guerra mundial no war... porém sem vitoriosos, e com acordo de paz dado timeout.








quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Reportagem da Revista Nautica

Puerto Rico, 17 de Novembro de 2016.

Aos amigos que não tiveram a oportunidade de ver a reportagem sobre nossa história na Revista Náutica mês passado, clique no link abaixo para vê-lá em PDF.





domingo, 13 de novembro de 2016

Puerto Rico, a ilha dos sorrisos

Puerto Rico, 13 de Novembro de 2016.

Hoje completamos uma semana em Porto Rico e até agora só temos coisas boas a falar desse lindo país. Seja pelo clima bem mais agradável (aqui chove todo dia!), seja pelo verde (aqui tem floresta tropical igual no Brasil... abarrotada de cachoeiras!), seja pela história (aqui tem fortes e construções de 450 anos atrás completamente preservados!), ou pelas mega lojas de tudo quanto é tipo (excelente para provisionamento) ou, principalmente, pela simpatia e astral do povo em geral. Eu diria que aqui é o país dos sorrisos... com pessoas amistosas, simpáticas que se cumprimentam na rua e estão sempre dispostas a ajudar. 

Logo na nossa chegada da marina já esbarramos com vários sorrisos: o sorriso do Bernardo e do Roberto - que trabalham na marina e nos ajudaram a amarrar o Itararé, o sorriso da Glenda - responsável pela administração, o sorriso do Horlando - barman quem fez o melhor hamburguer que comemos até aqui. Tivemos sorrisos até dos policiais da imigração que vieram até nosso barco para vistoriar de forma amigável tudo a bordo, acredita?! Esse clima astral de gente simpática parece que contamina o povo em geral e em segundos fomos fazendo amizade com outras pessoas que também moram abordo na marina. 

Aqui moram uns 3 a 4 militares aposentados e veio de um deles o convite para participarmos da comemoração do aniversário dos Mariners.... comemorado a última quarta a noite com um churrasco regado a lagostas no bar da piscina. Diferente do Brasil, o americano é muito patriota (não só em jogo de futebol) e tem muito respeito pelas forças armadas e guardam com muito carinho e orgulho suas tradições. Esse aniversário é celebrado a quase 300 anos e teve direito a bandeira americana, cartazes, charutos, bolo, discursos e leituras de cartas dos generais das forças armadas. Cerveja vem, cerveja vai e aos poucos fomos também conhecendo um pouco da história de cada um.

Um dos amigos, que mora em um yacht em frente ao Itacaré, já rodou o mundo acompanhando as guerras americanas por décadas. Esteve no Iraque, em várias bases americanas espalhadas por aí.. e por aí vai. Ele era responsável pela logística de abastecimento no front de guerra sempre levando até os soldados munições, armas, comida... seja lá o que fosse necessário. Com orgulho ele nos disse que conseguia tudo em menos de 24 horas e nunca nenhum batalhão coberto por ele ficou desassistido. Com tristeza ele também nos contou que veio da esposa dele a ideia de morar a bordo... e depois que ele se aposentou compraram um barco e se mudaram pra cá. O sonho foi interrompido precocemente pois pouco tempo depois ela descobriu um câncer e veio a falecer meses depois. Muito triste. Ouvir histórias como está nos faz lembrar de como a vida pode mudar rápido como o vento... e mais uma vez agradecemos a Deus por poder estar vivendo o que estamos vivendo hoje. 

Outro amigo que conhecemos foi um boina verde do exército (força especial - estilo John Rambo) e lutou todas as guerras dos últimos 30 anos. Esteve no Vietnã, Coreia, Iraque, Afeganistão, etc.... viveu muita coisa em tudo quanto é canto e hoje vive sossegado no seu veleiro de 45 pés. Forcei para ver se arrancava alguma estória pauleira dele mas ele se limitou a dizer que o "passado ficou para história e that's it!". 

Ficamos muito amigo de ambos... e no pouco tempo juntos já compartilhamos cervejas, barbecues e bons bate papos. Muito bacana.
 (Thank you guys for the time that we spent together... was a pleasure to met you!)

Mudando o assunto, Porto Rico, como você já deve saber, é parte dos EUA... e lembra muito uma cidade de interior americana com condomínios perfeitos de muro baixo e abarrotados de carrinhos de golf, mega lojas, grandes estradas e com a simpatia do povo latino. E o povo aqui gosta mesmo é de mega yacht (vimos poucos veleiros) - e nosso amado ITACARÉ até que ficou bem bonito amarrado no pier da Marina mas bem humilde ao lado de barcaças com o dobro do seu tamanho e iluminadas por todos os lados. Ele chegou a encolher de tão tímido.

Aproveitamos nosso tempo até aqui para fazer turismo no centro histórico (old San Juan), conhecemos também uma reserva florestal e matamos a saudade de um bom mergulho de cachoeira, e - claro - aproveitamos as mega lojas para provisionar o barco para os próximos meses. A visita a West Marine durou 8 horas... e me perdi entretido entre os corredores abarrotados de produtos náuticos de tudo quanto é marca e tipo. Dali o ITACARÉ ganhou uma âncora nova (Rocna de 25kg), ganhou também uma prancha de standup e mais um monte de miudezas. Comprei também um óculos e chapéu novo - a tripulação aqui tava se rebelando dizendo que meu chapéu antigo era de mendigo. Fazer o que.  Aos poucos nossa lista vem esvaziando e nosso bolso quase explodindo. Do Sams Club nos entupimos de rum, cerveja, vinhos, biscoitos, leite, carnes... compramos também várias garrafas de uma bebida vermelha chamada fireball, conhece? É destas pra ser tomar pura em "shots".. e que desce esquentando a garganta até o estômago. Se segura pois o bicho vai pegar! ..tudo já está preparado para recebermos amigos e familiares queridos que vem entre o ano novo e Janeiro.

Amanhã temos algumas manutenções pra fazer (pra variar! ...é como já falei antes, essa lista não acaba nunca!) e tudo dando certo, seguiremos viagem no dia seguinte para as Ilhas Virgens espanholas para "nos perdermos" pelos próximos 30 dias entre Viequez, Culebra e Culebrita.

Em breve mais notícias... e mais relatos de travessias. Acompanhem!

PS: Agora você pode acompanhar nossa posição em tempo real através do blog... clique na foto do "spot" no alto a direita. Este aparelho fica a bordo e emite um sinal via satélite e além de mostrar nossa posição serve também para chamar/apoiar o resgate em uma situação de emergência.



Ruas do centro antigo de San Juan (Old San Juan) 

Forte construido pelos espanhois a 450 anos atrás... muito bacana a visita


Motoca de um policial que estava parado em frente a
 West Marine... vendo a curiosidade das crianças ele convidou a molecada
para tirar umas fotos..

Dentro da West Marine procurando um chapéu novo pro pai.

Medalla é a cerveja local de Puerto Rico..  aproveitamos para
 provisionar o barco para os próximos 3 meses. #Itacareetilico!

Zé Cuca testando o peso da lagosta dentro de um restaurante

Parque Nacional El Yunque - nos lembrou muito
Serra do Mar - região entre Parati e Cunha, no nosso Brasil, 
visual bacana rodeado de mata atlântica







nossa vista do por do sol de dentro do Itacaré no pier da marina (Yacht Club Palmas Del Mar)

Churrasco de lagosta comemorando o aniversário
 dos US Marine Corps (fuzileiros navais americanos)







Nossa marina fica dentro de um mega condominio fechado com
 hoteis, campo de golf, casas, espetáculo! ..aproveitamos o domingo para colocar as bikes para fora do barco e
fomos desbravar o condominio. Gostou da minha chapeleta nova ?






domingo, 6 de novembro de 2016

Diario de Bordo: Bonaire - P. Rico

Travessia Bonaire - Porto Rico

Distância: 425NM (milhas náuticas)
Velocidade Média: 6,5kts (nós)
Duração: 2 dias + 19 horas (3 noites)
Saída: 4/Nov/2016 - Quarta - 16:30
Chegada: 6/Nov/2016 - Sábado - 12:00 


DIA 1 (Quarta) 20:00 / 400NM a sudoeste de Puerto Rico

Partimos as 16:30 da linda Bonaire. Agora são 20:00 e a tripulação toda já desabou no sono. Sobraram eu, meus pensamentos, um mar escuro a volta e um filete de lua escondida entre as nuvens. Quanta expectativa acompanhou nossa saída!

Mergulhei novamente na análise do tempo, em pesquisas da melhor rota e muitas dúvidas surgiram...  A verdade é que dado a falta de experiência não sei até que ponto podemos confiar nas previsões e logo bate uma puta dúvida sobre que melhor janela de tempo pegar. De novo me apoiei no Silvio que do Brasil nos ajudou na escolha da melhor rota e janela de tempo (valeu SR!).

Escolhemos seguir viagem essa semana pois desceu um frente fria entre Porto Rico e Republica Dominicana ...e a entrada dela no norte do Caribe fez o ventilador do sul do Caribe rodar ao contrário.... e até desligar. Logo a previsão é de calmaria seguida de vento sul e sudeste, o que é bom pra gente que quer subir ao norte.

Até agora - 4 horas após nossa partida... Está tudo calmo a nossa volta, nada de vento e mar parado. Seguimos nosso rumo a nordeste motorando a 5kts.. bem ruim (tem uma corrente freando a gente), mas deve melhorar depois que nos afastarmos da Costa. Previmos uma média de 6,5kts - em uma travessia que deve levar quase 3 dias ... Vamos ver.


DIA 2 (Quinta) - 14:00 / 315NM ao sul de Puerto Rico

A previsão do tempo se confirmou e até aqui só tivemos calmaria. O Itararé vem deslizando liso sem sacolejos e a vida segue normal a bordo, ninguém enjoado... Já vimos 3 filmes (um deles foi o Rambo I, lembra dele ?!).

O ruim é que tivemos que motorar até aqui e mesmo assim o barco vem andando pouco mantendo média de 5kts (uma bosta!). O diabo da corrente contra continua freando a gente. Me arrependi de não ter enchido os galões de diesel reserva. Se tudo der errado e as previsões furarem e tivermos que manter este ritmo podemos levar 1 dia a mais pra chegar e o combustível (ou a falta dele) pode ser um problema. A previsão do tempo nos jura que ao longo da noite entra um Sudeste... Vamos ver, estamos aguardando ansiosamente por ele!


DIA 2 (Quinta) - 17:00 / 280NM ao sul de Puerto Rico

Completamos 24 horas de travessia... E andamos 145milhas até aqui... Ruim.

A parte boa é que há duas horas atrás o vento nordeste entrou (esse aqui a previsão não falou nada) ..não é o ideal mas já melhorou muito. Desviamos nosso rumo 30 graus e agora seguimos N (ao invés de nordeste), já deu pra desligar um dos motores e o barco passou a andar a 7kts - ótimo, voltamos pro jogo! ...podemos ficar assim pelas próximas 12 horas até a entrada do Sudeste amanhã de manhã.

O mar também foi generoso com a gente e nos brindou com um dourado de uns 3kg (!?) ...a cabeça já virou caldo e os filés vão pra panela mais tarde. Do mar também vieram 3 passarinhos exaustos de tanto voar. São duas andorinhas (tudo bem esbarrar com elas aqui) - mas o outro é um destes amarelinhos de jardim. O Que você está fazendo aqui tão longe da costa rapaz?! ....se o Itararé não tivesse passando você ia dormir aonde ?

...agora tá uma briga a bordo entres as crianças pra definir quem é dono de quem. Já avisamos que eles são da mãe natureza e a hora que eles quiserem eles seguem viagem.






DIA 3 (Sexta) - 09:00 / 177NM ao sul de Puerto Rico

O vento aumentou a noite e o mar cresceu junto com ele. Rizamos as velas no riso 2 por segurança e o Itacaré veio bem de 6 a 7 nós sem esforço. Nosso marcador de vento não está funcionando, mas pelos carneirinhos eu chutaria de 15 a 20 nós de vento. 

A noite foi boa, velejamos bem (apesar de balançar muito) e não tivemos nenhum rumo cruzado com outro barco. O turno desta vez foi todo meu... A Branca ficou um pouco mareada e achamos melhor ela sossegar na cama. Eu Dormi na sala acordando a cada 45 minutos para fazer minha "ronda": procurar algo no radar, avaliar a velocidade e nossa rota, sair para ver o mar confirmando que nada temos a frente e regular uma vela se necessário. E assim, de pulos de 45 minutos e sonhos interrompidos a noite correu rápida.

Amanhecemos todos bem e o mar ainda está meio bagunçado e vento segue firme de Sudeste (espetáculo!). 

O barco sacode, range... Se contorce, e seguimos firme nosso rumo e parece que toda tripulação já se acostumou com os barulhos do mar. Graças a Deus a previsão acertou na cabeça! 

Progredimos muito na nossa rota e mantendo as condições atuais (e as esperadas) devemos aterrar em Porto Rico amanhã no meio da manhã. 

To feliz das coisas estarem caminhando bem - na torcida que se mantenham assim! (Ps: depois destas 24hrs de vento favorável zerou o risco da falta de combustível!).

...pra finalizar, os passarinhos se foram. As andorinhas acordaram e saíram voando, já o amarelinho (que meu caçula apelidou de Jack) acordou morto. Foi pro mar virar comida de dourado. Achei que pudesse ter choradeira a bordo, mas que nada os moleques encararam de forma natural e jogaram o bichinho no mar. Vida que segue.

PS: Dizem os meninos que a causa da morte foi um golpe de ioga da mãe, pois na noite anterior o bichano correu o barco inteiro e sem querer foi parar esmagado nas costas da mae enquanto ela se contorcia em uma das posições no solo. De qualquer forma, para mantermos a paz a bordo, prefiro a versao da morte por fadiga de tanto voar.




DIA 3 (Sexta) - 19:00 - 110NM a sul de Porto Rico (Tamo chegando!!!)

O tal vento Sudeste apareceu com vontade de novo à tarde... E junto dele veio um Squall (tempestade) que ligou forte o ventilador e o liquidificador tudo ao mesmo tempo. 

Agradeci a todos os santos por termos feito uma rota mais a nordeste-leste no começo da travessia.... Pois agora que a bagunça chegou, tivemos a opção de correr junto com ela (norte - noroeste) sem grande prejuízo à nossa rota. E o que poderia virar um salseiro pouco foi percebido pela tripulação que via mais um filme na sala.

A chuva acabou servindo para lavar o barco e para nos acelerar até nosso destino. Mas não pense vc que foi moleza não... Pois tudo aqui é novidade pra gente e vem tudo sempre acompanhado de frio na barriga e muito suor. Ralei bastante rizando velas, ...experimentando a melhor configuração pro mal tempo e ajustando tudo a bordo. Até que fiz pouca barbeiragem (assim acredito)... Um degrau por vez e vamos progredindo.

A tarde também rendeu uma boa pescaria... Desta vez foi um atum de uns 4kg (virou sashimi e morreu a tarde mesmo!)

Enquanto escrevo seguimos firme a 7kts empopado e com as velas risadas. Apesar das condições estarem mais calmas achei melhor ir assim por segurança. Preservando as condições atuais devemos avistar terra amanhã pela manhã... 


DIA 4 (Sábado) - Marina Puerto del Mar - lado leste de Porto Rico (chegamos!)

Escrevo estas palavras deitado na cama, de banho tomado, barba feita, sossegado.... e com o Itararé devidamente amarrado em uma vaga na Marina Puerto del Mar. 

Dizem que a vida da gente é um eterno quente-frio, ...ora você quer à praia ...e dela, com calor e suado vc fica com saudade do friozinho da serra, e assim por diante. Eu digo que o mesmo vale também pra vida no mar.

As duas melhores horas de uma travessia são justamente a hora de sair e a hora de chegar, por motivos opostos. A primeira você tá doido pra se lançar na imensidão do mar, ficar perdido entre o céu e as estrelas, no silêncio, em pensamentos e exposto a mãe natureza. O segundo melhor momento é justamente o oposto... Quando paramos de sacudir, e estamos seguramente amarrados em uma Marina, de banho tomado, cheiroso.. De barba feita e lençol recém trocado e esticado ao máximo. Este é meu sentimento agora. Feliz de ter chegado, sentimento de realização por ter cumprido mais um degrauzinho nesta nova fase da vida.

Quente-frio foram também estás 3 noites de travessia... tivemos de calmaria à tempestades... Noites mal dormidas e bem dormidas. 

Mas neste último dia a coisa foi mais pro "frio" mesmo dado que o mal tempo cismou em dar as caras e viemos com vento acima de 25 nós (estimo) tanto de dia quanto a noite e mais uma vez o barco bateu e sacudiu muito. Ralamos muito a noite toda em ajustes de vela dado que o vento e mar não sossegaram e por vezes variaram força e direção. Acho que perdi uns 2kg na viagem ao todo... Mas logo que chegamos tratei logo de combater o problema com um hamburgao e três cervas no happyhour da Marina. ;)

Mais pro "quente" é sempre a minha Branquinha, minha alma gêmea - que encarou de frente todos os medos e inseguranças, e não se abalou com mar alto, com a escuridão da noite, com o burrifo das ondas e barulho delas batendo no casco, ou mesmo com a chuva forte lavando até pensamento. Menina danada... amo vc xulé ! 

Pra finalizar... a primeira impressão que tivemos daqui da Marina e de Porto Rico é a melhor possível - mas isso é assunto para um próximo post. Até !